Eu creio em Deus.
Tão simples assim.
Não sei por que os
homens
Já zombam de mim.
A fé que eu tenho
É igual a de todos,
Com um diferencial:
Não quero ser
todos.
De pose erguida,
De peito aberto,
Assim são os
homens,
Achando-se certos,
Cuspindo nos
verbos,
Nos textos de
versos.
E saem as palavras
de aclamação,
Reviram-se os
olhos,
Se rasgam as mãos,
São gritos e gritos
Em fermentação.
As igrejas de fora
Só matam as de
dentro,
Traduzem essências
Em vãos
sentimentos,
Recriam a mentira
Em pobres momentos.
O Livro Sagrado
Sozinho está,
Somente leitores
O domam no lar.
Na vida são folhas
Caídas ao mar.
Porque ser cristão
É igual a uma
roupa:
Mostra só fora,
Por dentro é
estopa.
E assim vêm as
lágrimas
Do santo calvário,
O verbo primário
Cravado no chão.
Dizer que o ama
Já vale um tostão.
E as sanguessugas
Agora farejam,
Rastejam em
serpentes,
Remoem os bolsões,
Inflamam as almas
Já tristes de
história,
E vendem uma glória
Que o diabo lhes
deu.
E a fantasia agora
se aclama,
Levanta da cama
Ossos despojados,
Oferece aos céus
Um fraco coração
E guarda nos bolsos
As glórias da
terra.
Se é paz, se é
guerra
Já não me importa,
Toda porta torta
Está doida de
razão.
Razão é o nome
Que alimenta a fé,
Pois sei que isto é
Como comprovação:
Se um remédio não
cura
Cura a oração.
E assim várias
portas
Já levam ao inferno
E fingem os
invernos
Com raios, trovões.
Se é profecia
Bem sei que assim
é,
Mas medo não há,
São só sopros de
bocas,
Malditas e ocas
Das cifras de pão.
Da terra aos céus
Não há mais
direção,
A não ser que a
razão
Assim vá conceber.
Enquanto episódios
Consomem as carnes
O lucro aqui arde
Em boas direções.
Ninguém está
errado,
O certo é alguém
mesmo,
Ninguém mais
contesta
O lombo na testa
Dizendo:
Eu sou santo.
Então falsos
prantos
Acabam o silêncio
E enchem os ventos
De falsos clamores.
Não há mais
doutores
Na face da terra
Na maldita guerra
De fé e razão.
A paz decadente das
religiões
Gerou maus botões
Que apertam a camisa.
Criou duas faces em
todas as bocas:
Por fora se diz:
“Paz entre os credos”
E dentro se range:
“Que a morte te leve”.
Tudo é tensão
Na realidade.
Nada se fala
Sem
Olhos legais.
Até o juiz faz
santo juízo:
Aqui pode isso, ali
já não mais.
Quem tem a razão é
quem tem fé?
Pois se assim for,
fé o que é?
E dizem as bocas
Que própria é a
razão
E que todo cristão
É por si governado.
Se o circo é assim,
então
Mais questão:
Eu estou falando de
igreja
Ou de leis do
Estado?
Alguns condutores
De fortes falácias
Levantam os médicos
E lhes destituem a
razão
E levantam do chão
Então seus exames
E mandam que os
chamem
“Milagres,
irmãos!”.
Já há nova bíblia
Nas mãos
tenebrosas,
Pois dizem o que
querem
E já mostram suas provas.
Quem é que contesta
Uma voz forte e grossa?!
Se cada cristão tem
sua razão
Então não há razão
Para a fé existir.
Já bastam os homens
De ares cordeiros
Tão bons
justiceiros
Que gabam a si.
Se o centro de tudo
Foi capitalizado,
A fé no Estado é
submissão.
Se erguem as fardas
E baixam-se as batas,
Antes que se batam
A fé e a razão.
Fé é produto
De boa propaganda
E quem nela manda
Descreve o que é.
Os outros decoram
E pagam o dízimo.
Daí saem santos
Em nome da fé.
Religião é milagre
E ponto final.
Senão não atraem os
homens do mal.
Mais forte é quem
cria
Mais boi no curral.
De juízo final
Ninguém mais tem
medo.
Já não é segredo
Se Deus vem ou não.
Só é cálix bento
O vinho azedo
Que embriaga
O estômago
Da boa razão.
Eu disse então
antes
Que creio em Deus
Igual aos demais
Da venda do céu.
Não quero ser
todos.
Isso não, nunca.
O que me proponho
A não ser os demais
É ter uma paz
Que sim se
conquista.
Não é uma missa
Que a isso me traz.
Fazer um projeto
De relação
Onde a tal razão
Um pouco sucumbe,
Deixando meu ser
Alcançar bom
vislumbre.
Usar a razão
Pra dizer como fé
É matar grandes
almas,
E negar que isso é.
Não vale essa
equivalência
Entre o santo e o
governo.
A fé é maior, mas
Só a negam, é
segredo.
Então seguem todos
A um fatal degredo.
Não falar para agir,
Assim não me culpam
De incoerência,
Embora a demência
Entreguem a mim,
Pois quem não fala
De fé
Fé nunca tem,
Só valem os gritos.
Assim a concebem.
Discordo já disso,
Pois penso em
sentir,
Ouvir sem barulho,
Até quando há
vozes, pois
Sei que o silêncio
É vocação.
Então a razão
Já sai de lugar
E deve sugar
O tão seco chão.
Em fé volta o homem
À essência de tudo.
De tudo liberta-se
E faz renovação.
Refaz até a razão
Por passos da fé,
Pois já viu como é
Se errar,
Erra são.
Mas a natureza
Negou o retorno,
Não vale o suborno
Da essência dela.
Por isso que o
homem
Já está condenado
A vagar pelo mundo
Recriando as
guerras.
Então perde a fé,
antes mesmo
Que o homem.
Pois se some ela
Ele em tudo é nulo.
Só vive a pagar
Os erros da
história
E a sonhar com a
glória
De em tudo vencer.
Mas vencido já sabe
Que o céu pouco
alcança,
Então sua balança
Só pesa o mercado.
E o pouco salário
Que ganha na terra
Comprará morte
eterna
A razão isso paga.
(Mirinaldo)