PROFESSOR,
MISSÃO DE QUÊ?
A presidenta
Dilma, no seu discurso de posse, disse que a educação só vai melhorar quando o
professor for o verdadeiro protagonista do processo educativo. Uma
apresentadora de TV disse que achava que professor deveria ser o mais bem pago
de todas as profissões. Programas de governos municipais ganham frases
mirabolantes que parecem dar à educação e ao professor uma magnitude
esplêndida.
Mas isso
tudo é balela. Um dia desses, vi uma reportagem na TV Liberal, o canal que mais
odeia os professores do Pará, e que chamou minha atenção. Era sobre um
professor que remava como um condenado pelos rios da Amazônia, tendo até que
carregar a canoa para levar um projeto de futebol a alunos isolados na
floresta. A reportagem encheu esse homem de honras. Também, muito antes dessa
reportagem, cheguei a ver dezenas de outras matérias que mostravam professor em
cima de jegue, cavalo, canoa, andando por caminhos fechados ou pelo cerrado da
caatinga. Ao final de todos esses exemplos, sempre vinha uma frase: isso que é
dedicação!
Você já
parou para pensar nessa ideia estúpida que a mídia passa sobre o que é ser bom
professor? Já prestou atenção nas novelas, como aparece uma professora
boazinha, grande amiga e que demonstra não necessitar de salário?
Pois é. Esse
é o professor da Rede Globo, da Record, do SBT e de todos os meios de
comunicação a serviço da ideologia dominante. A do professor tapa-buraco, o
sofredor, pagador de promessas, que ri em meio à própria desgraça.
Nessa imagem
de “professor perfeito” está a ideia de homens e mulheres que devem amar,
dedicar-se sem medida ao ensino, à escola, ao sistema. Devem ser desprendidos,
humildes, submissos e viver dando aulas com um violão ao lado, mesmo sendo
indivíduos que têm obrigações sociais e políticas.
Falando em
política, a imagem do “professor perfeito” da mídia é de alguém que domina
conteúdos, é um transmissor de assuntos, mas é um ser limitado ao que chamam de
escola, que também, pela mídia, é colocada como um lugar de recreação e de
assimilação de matrizes estabelecidas pelo governo federal. “Professor
perfeito” não faz greve. Aliás, já prestaram atenção que quando se noticia uma
greve de professor, geralmente só se mostra entrevista de pais e alunos
revoltados, que estão perdendo aula e conteúdos? Professor, em greve, não perde
nada. É folga. É manha. Aluno e pai perdem tudo. Enquanto a gente se distrai
ouvindo as lamentações, a gente, ao final de uma reportagem dessas, não sabe
por que aconteceu a greve. Outra: professor não pode ir às ruas com faixas e
cartazes reivindicar algum direito. Isso é falta de educação. Portanto, professor
é uma árvore cuja raiz fica na sala.
Outra coisa:
você sabia que o “professor perfeito” da mídia é mentiroso? Não? Pois é,
passa-se essa ideia. Quando professores grevam por melhores salários ou por
melhores condições de trabalho, alguém do governo vem e diz que tudo já foi
feito. E as reportagens são tão bem montadas que até professor desprevenido cai
e acredita que o que os seus colegas estão fazendo é sem fundamento.
Viram?
Professor não pode pensar.
Outra imagem
criada pela mídia é a do professor carrasco, mal-amado, desgostoso da vida. Ele
geralmente é ignorante, estúpido, um bruto, porque estaria vivendo mais pelo
salário que pelo amor ao trabalho na educação. Ou seja, professor quando recebe
pelo que trabalha passa a ser alguém amargo, solitário, assexuado, estrábico,
desprovido até de boas maneiras.
Quando há
algum pretenso prestígio ou é demagogicamente apresentado, o professor é alguém
sério, com voz firme, com discurso linear, científico, sem emoção, sem
movimento. Ou então, quando é legal é alguém que se mete na vida dos alunos,
ouve segredos, dá conselhos pessoais, abraça, é engraçado, canta o tempo todo e
vive na profissão sem saber para quê.
Mas o mais
engraçado nisso tudo é o paradoxo da mídia. Ao mesmo tempo em que fantasia, ao
seu modo, a figura do professor, profetiza que está nas mãos desse profissional
o futuro da nação e que ele irá trazer as mudanças de que o país precisa.
Político, então, adora contar uma balela em cima de professor.
E não para
por aí. A mídia não está sozinha. Já ganhou a maioria dos alunos. E dos pais, então,
nem se fala. Aluno também tem seu pensar sobre a figura do seu “mestre”. Li um
dia desses um texto de autor desconhecido que dizia que a imagem do professor é
difícil de ser feita, pois ele não pode viver de extremos, ou seja, se é
engraçado é debochado e se é sério é um carrasco. E por aí vai. Realmente. Mas
no momento em que as coisas acontecem na escola, aluno joga o tempo todo com
isso. Como o interesse pelo aprofundamento no conhecimento é escasso, o aluno
carimba o professor. Sabe como? Ele induz o seu “mestre” pela artimanha do
interesse ou do desinteresse. Caso se mostre interessado, exige um pouco mais
de seriedade, quando não, relaxa e induz o professor a ser engraçado e
divertido. É nessa última parte que o
“mestre” cai na armadilha. Jogar nas regras do aluno é cair um pouco nas
artimanhas do sistema midiático que também finge que não sabe o que quer
extrair desse profissional. O aluno não quer absorver a docência e a mídia quer
coibir o papel de consciência sócio-política, o que abalaria o sistema
convencional se a sociedade acreditasse nos professores e não nas novelas.
Pensando assim, o aluno perde o mestre, ganha tempo e empurra o sistema com a
barriga.
Cercado de
tantos estereótipos, o professor tornou-se uma figura quase sem função social
nenhuma. O próprio descrédito dos alunos é um reflexo do que pensa a sociedade.
O professor tem mais culpa que qualquer outro segmento da educação. Se ele
dobra a testa, denúncia dele. Professor não pode errar. Esse é o sonho de
milhões que gostariam de zombar dessa figura. Quantos não gostariam de
encontrar só os defeitos de um “mestre”. Quando se denuncia um professor, o ego
do denunciante estufa, seu queixo se eleva e sua voz ganha potência. Dá orgulho
falar mal de professor. Até mesmo quando um fala do outro.
Professor é
alguém que só ganha alguma mísera relevância quando está na sala de aula. Fora
dali, não tem sublimação, é o cara sem progresso social, sem camada, sem casta,
é alguém encolhido nos cantos.
Mas a figura
desse “mestre” maltratado pela mídia, ignorado pelos pais dos seus “discípulos”,
odiado por muitos alunos e massacrado pela sociedade capitalista ignorante,
pode mudar, pode quebrar barreiras e se erguer como fênix.
Pode e deve
ser sublime, ser respeitada, ser amada, ser agraciada pelo reconhecimento do
dom natural do magistério.
Pode ser
reconhecida pelo valor que se deve dar a quem dissemina dúvidas e problemas,
questões e desafios, pois professor não ensina, não transmite conhecimento.
E esse dia
está dentro de cada um de nós e, se somarmos esses dias e os juntarmos todos,
teremos um grande tempo quando veremos, de fato, o magistério ser lido e
tratado como a arte do despertar e do prazer e do orgulho ímpar de se dizer
estufando o peito: muito prazer, eu sou professor!
Eu sou
professor!
(Mirinaldo)
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