segunda-feira, 8 de abril de 2013

QUEM É, AFINAL, O CARA?



           

Um texto no Facebook chamou minha atenção ao se reportar ao personagem Téo (ou Théo), da novela Salve Jorge. A escrita, basicamente, trazia a informação dos relacionamentos que esse personagem vive na novela e que recebe o apoio de uma ampla margem do ibope feminino. A ideia central do que eu li está em torno do seguinte: Téo é um garanhão. E só. Ou seja, a ele se pode dar o direito de defender um pretenso amor (margeando o platonismo) e ser visto como detentor de um caráter inquestionável por conta da sua luta de cavalaria em nome de uma donzela que ainda vai sofrer por não poder viver esse grande amor.
            Pois bem, vamos entender melhor esse “mocinho”. Antes, quero me reportar a outra novela lançada no horário das nove, O Clone. Na época, era quase unânime a torcida para que Jade, que era casada com Said, vivesse seu amor com Lucas, que por sua vez, era casado com Maysa. Como o amor dos heróis não foi possível, devido às convenções do casamento, então Jade passa a ter encontros extraconjugais com Lucas, o que é muito bem recebido pelo público.
            As duas histórias, embora em anos e tempos diferentes, têm muito em comum. Ambas deturpam a ideia original de amor platônico, por incrementarem um velho comportamento humano: o adultério. Ou seja, para se ganhar audiência, vale-se de histórias que parecem (eu disse parecem) retratar a luta pelo verdadeiro amor, mas às quais se permite o gozo das relações de aventuras e de traições. Busca-se justificar o adultério por os personagens encontrarem em seus caminhos pessoas que atrapalham a realização plena do amor.
            Téo é um personagem que recebe aceitação pelo que faz por justamente se encaixar no antigo mundo das fadas: ser bonito e galante. O vai e vem nos relacionamentos do personagem não sofre retaliação do público por ele deter a máscara do homem ideal: bonito. Ou seja, Téo viveria a figura de um romântico.
            A música de Roberto Carlos é outra que perdeu seu sentido por não se relacionar mais com as novas práticas do galã (violento, revoltado, vingativo, adúltero). Mas o poder do cavaleiro é comprovado na maneira como ele trata outra personagem tida como dura e resistente: Lívia. O fato de Téo a ter aos pés dele e humilhá-la propõe a ideia da força do seu encanto e isso “legitima” seu caráter e o torna um herói aparentemente completo.
            Outra, Téo está se encontrando novamente com Morena, o que foi muito bem recebido pelos telespectadores, mesmo ignorando o fato de a atual mulher dele ser “merecidamente” ignorada e enganada. Para o público, isso é uma luta pelo amor. E vale a pena. Agora só resta Glória Perez tornar Érica uma mulher obsessiva, violenta e amarga (da noite para o dia). E o público odiará essa personagem (da noite para o dia).
            O “Esse cara sou eu”, de Roberto Carlos, é só uma vendagem de sonhos, igual aos mesmos discos vazios do cantor, assim como os exemplos de Téo são uma máscara alimentada pela necessidade do Ibope na audiência “global”. Téo não é o verdadeiro romântico, é apenas uma representação do galã de novelas brasileiras.
            O resultado disso é uma moeda. De um lado, percebem-se bem retratados os relacionamentos frágeis e adúlteros do nosso tempo e, de outro, a injeção de credibilidade de que isso é absolutamente aceitável e natural. Banal. Trivial. Um círculo vicioso e normal.
            E os bons valores, as igrejas, as escolas e a família perderam ante o comodismo televisivo criado no Brasil: a violência já não espanta, a corrupção já não espanta, a miséria já não espanta, o erotismo já não espanta e o adultério já não espanta. Vivemos ante o oco moral histórico construído ao longo dos séculos e ganhando legitimidade por conta da nossa tão argumentada natureza humana vulnerável ao erro.
            Vivemos numa sociedade sem bons ídolos, sem boa música, sem políticas sociais verdadeiras, com poucas práticas religiosas, com alto consumismo, com nossa submissão à tecnologia, sem a célula familiar funcionando como deveria e agora sem qualquer pudor para se justificar que estamos amando. Não se precisa ter profundeza, nem se provar que se ama alguém, bastam cenas e frases de efeitos publicitários para que a beleza exterior (a física) ganhe a força de um caráter. Impressionou? Então é amor!
            Depois disso tudo, é simples afirmar que Téo não representa mais aquele romântico pregado naquela música e que ele é mais um homem comum, mais do que se imagina. Seus vícios estão vindo à tona. Seus lances recheados de infidelidade fazem-no cair do cavalo. Não sei se a ideia de Glória Perez era a de propagar um tipo ideal, mas que esse que aparece na novela é muito carne e osso, isso é.
            Mas, a ideologia por trás disso tudo chama a atenção, pois, o fato de o público justificar a traição ao mesmo tempo em que parece refutá-la em seu cotidiano, põe à mostra o caráter duvidoso do brasileiro e a evolução de um comportamento histórico aqui arraigado: o do comodismo.
            Esse comodismo trouxe ao nosso presente a aceitação indiscutível e cega dos valores impostos pelos maus costumes. Assim como muitos dizem que se um político roubar, mas fizer alguma coisa já está valendo, assim também estão analisando certos fatos apenas por um ponto de vista. É o caso das novelas, como Salve Jorge, em que o público fica do lado de quem “se ama” e ignora a dor de quem deixou de ser amado, provando que o que acontece com os outros é com os outros. E que o amor é assim mesmo. E pronto. E traindo é melhor ainda, parece uma luta!
            Ante à fraca imagem de um herói pretensamente romântico, mas que caiu no  corpo de um garoto propaganda e a evolução do comodismo do brasileiro, cabe questionar: em que lugar se pode confiar em alguém? No Facebook? Em casa? Em que lugar e ocasião as pessoas realmente se amam? O que se vive hoje se vive para si e para o seu outro ou se vive apenas para que outros vejam que você vive “bem”?
            Então, trair alguém vivendo certas fantasias eróticas, sexuais, fazendo sexo pelo telefone, pela internet, pelo celular é normal? Na televisão é. Alguém aceita isso em sua vida real?
            Quantos Téos a Globo vai produzir? As Jades vão voltar? Com certeza. Isso está ligado ao mercado, ao capitalismo, não ao que nossos antepassados nos deixaram. As novelas só vão mudar se nós também mudarmos. Os valores e ensinamentos que elas estão proporcionando ao público vão de acordo com o que esse público acredita. Nesse caso, a mídia alimente o povo e o povo alimenta a mídia.
            Portanto, ver novela e entender novela precisam ser separados. Do contrário, o Téo está certo, porque “ama” a Morena e a Érica está errada e louca, pois está com um homem que amava uma morta. Detalhe: só nós sabíamos disso.

Mirinaldo, Vitória do Xingu, 08 de abril de 2013.

Um comentário:

  1. Sábias reflexões, estamos juntos professor. Mas quem será é o CARA? os protótipos apresentados pela mídia são inversões de valores! professor Jairo, dá uma olhadinha na minha página brother! www.profjairo07.bolgspot.com.br

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