Por Mirinaldo
A questão de o precatório ser
ou não dos professores transcende o plano do direito. O judiciário já
argumentou que se trata de enriquecimento ilícito da categoria. Daí os
executivos compraram esse argumento e armaram seus discursos de que os valores devem
ser empregados nas artérias físicas do sistema educacional. Ou seja,
transformaram o que era FUNDEB em um recurso sem nome de batismo e criaram
outra finalidade em que fizeram questão de excluir IMEDIATAMENTE os trabalhadores
em educação. Em véspera de ano eleitoral, um montante sem nome passa a servir
como mosca de padaria. Mas se é FUNDEB, paga-se como FUNDEB. O problema é que
os executivos dizem que não e nós, que sim.
Mas o que quero tratar aqui
diz respeito ao âmago da questão. Quando os executivos afirmam que não vão
pagar folha com esse recurso, há muito mais o que entender. Há muito mais
organicidade do que se imagina.
Entendamos.
Estamos submetidos a uma malha
contra a qual lutamos diariamente. Ela liga-se a um plano global de articulação
em que duas forças se embatem numa arena sócio-política. Funciona assim: o
mundo só possui dois lados: conservadores e libertários. Nós pertencemos ao segundo,
mas suamos todos os dias pelo primeiro. Por quê? Porque eles venceram e vencem
as falsas disputas de poder político. Por que “falsas”? Porque quando o lado
libertário apresenta qualquer iminência de ascensão, o outro lado altera as
formas do sistema que passa a atuar como escudo e flecha agindo opressivamente
sobre os libertários, atacando sua filosofia, prática e causa. Tudo ocorre em
escala global, mas há ataques e monitoramentos locais, numa espécie de ação em
aldeia. Os conservadores mantêm constante vigilância sobre pequenas
resistências, controlando-as, desintegrando-as ou massacrando-as. A estrutura,
a configuração de poder montada pelos conservadores é muito dura, quase
impenetrável, protegida por séculos de ações padronizadas, articuladas em todos
os pontos. Não há um centímetro de terra que não seja monitorado, que não seja
uma arena. Estão articulados aos interesses dos conservadores, por exemplo: as
forças armadas, a polícia, o judiciário, o capital, a economia, a grande mídia
e as camadas sociais mais favorecidas. Todas as falsas chamadas políticas
públicas estão subjugadas aos interesses desses conservadores. Até religiões
estão aparelhadas a eles. Aprenda: os conservadores não são verdadeiros
guardiões da moral, mas sim do poder. A moral é estratégia do discurso, não das
ações. É somente o poder que eles “conservam”, daí “conservadores”.
Dentro desse plano do discurso
estamos nós, os professores. Nós não fazemos política, só a executamos. Há um
limite do que nós podemos ou não pensar, há um controle do que fazemos
pedagogicamente, há um monitoramento do que somos dentro e também fora da
escola. A força impressa sobre nós não é igual à empregada sobre as outras
categorias por uma razão muito simples: a promoção da consciência libertária.
Se isso ocorrer, rui-se todo o trabalho dos conservadores e o jogo os
desfavorece em todos os sentidos. Mas isso está longe de ocorrer. Nem o voto o
fará tão cedo, nem é certo que seja por ele, pois ainda estamos presos à ideia
de votar como ato e não como atitude. Agora passe a entender de uma vez por
todas: nosso piso salarial é uma falsa ideia de que não receberemos nenhum
valor abaixo dele, mas os valores acima servem apenas para nos nivelar dentro
de um controle econômico que não nos permite crescer em bens tanto intelectuais
quanto materiais, ou seja, já nos está estabelecido o limite do quanto podemos
comprar e o que comprar; não estamos livres nem para a aquisição de livros,
isso por si só já prova como estamos num nível de absoluto controle.
Nossa carreira, para imprimir
um calar rigoroso sobre algum possível despertar, é sufocante justamente para
que os conservadores não percam as rédeas da situação, do contrário, se
deixarem o nosso trabalho arejar a consciência, eles serão alertados sobre possíveis
riscos. Entendeu agora por que temos salas lotadas e carga horária
sobre-humana? Não é nada por acaso. É tudo parte de um planejamento. É você que
não para para ver e sentir. Até você já assimilou isso como fruto do
naturalismo. Você ainda acha que um dia isso será mudado, mas nunca parou para
pensar que isso não foi feito para sofrer mudança alguma.
Agora já é possível entender
por que os executivos NÃO QUEREM pagar o FUNDEB como o FUNDEB é e para o que
ele é. Não é só um sadismo local, de fazer os professores sentirem o
“cheirinho” – mas não ter o que lhes pertence – é um compromisso desse local
com o plano global que não permite alimentar nenhum tipo de bonança, mesmo que
momentânea, já que o uso desse recurso não produzirá riqueza a professor nenhum.
Mas se assim não for, os conservadores se dirão passados para trás. Fere-lhes o
ego amargamente, já que os professores não compõem a lista dos que podem ter
ascensão social.
Então, dentro dessa linha:
professores sem precatório.
A outra linha: “dialogar”.
Entre aspas, se é que me entendem.
Vitória do Xingu, 28 de maio
de 2019.
(reportar erros:
Mirinaldo.silva@yahoo.com.br)
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