sexta-feira, 11 de outubro de 2019

O precatório não é dos professores por quê?



Por Mirinaldo

A questão de o precatório ser ou não dos professores transcende o plano do direito. O judiciário já argumentou que se trata de enriquecimento ilícito da categoria. Daí os executivos compraram esse argumento e armaram seus discursos de que os valores devem ser empregados nas artérias físicas do sistema educacional. Ou seja, transformaram o que era FUNDEB em um recurso sem nome de batismo e criaram outra finalidade em que fizeram questão de excluir IMEDIATAMENTE os trabalhadores em educação. Em véspera de ano eleitoral, um montante sem nome passa a servir como mosca de padaria. Mas se é FUNDEB, paga-se como FUNDEB. O problema é que os executivos dizem que não e nós, que sim.
Mas o que quero tratar aqui diz respeito ao âmago da questão. Quando os executivos afirmam que não vão pagar folha com esse recurso, há muito mais o que entender. Há muito mais organicidade do que se imagina.
Entendamos.
Estamos submetidos a uma malha contra a qual lutamos diariamente. Ela liga-se a um plano global de articulação em que duas forças se embatem numa arena sócio-política. Funciona assim: o mundo só possui dois lados: conservadores e libertários. Nós pertencemos ao segundo, mas suamos todos os dias pelo primeiro. Por quê? Porque eles venceram e vencem as falsas disputas de poder político. Por que “falsas”? Porque quando o lado libertário apresenta qualquer iminência de ascensão, o outro lado altera as formas do sistema que passa a atuar como escudo e flecha agindo opressivamente sobre os libertários, atacando sua filosofia, prática e causa. Tudo ocorre em escala global, mas há ataques e monitoramentos locais, numa espécie de ação em aldeia. Os conservadores mantêm constante vigilância sobre pequenas resistências, controlando-as, desintegrando-as ou massacrando-as. A estrutura, a configuração de poder montada pelos conservadores é muito dura, quase impenetrável, protegida por séculos de ações padronizadas, articuladas em todos os pontos. Não há um centímetro de terra que não seja monitorado, que não seja uma arena. Estão articulados aos interesses dos conservadores, por exemplo: as forças armadas, a polícia, o judiciário, o capital, a economia, a grande mídia e as camadas sociais mais favorecidas. Todas as falsas chamadas políticas públicas estão subjugadas aos interesses desses conservadores. Até religiões estão aparelhadas a eles. Aprenda: os conservadores não são verdadeiros guardiões da moral, mas sim do poder. A moral é estratégia do discurso, não das ações. É somente o poder que eles “conservam”, daí “conservadores”.
Dentro desse plano do discurso estamos nós, os professores. Nós não fazemos política, só a executamos. Há um limite do que nós podemos ou não pensar, há um controle do que fazemos pedagogicamente, há um monitoramento do que somos dentro e também fora da escola. A força impressa sobre nós não é igual à empregada sobre as outras categorias por uma razão muito simples: a promoção da consciência libertária. Se isso ocorrer, rui-se todo o trabalho dos conservadores e o jogo os desfavorece em todos os sentidos. Mas isso está longe de ocorrer. Nem o voto o fará tão cedo, nem é certo que seja por ele, pois ainda estamos presos à ideia de votar como ato e não como atitude. Agora passe a entender de uma vez por todas: nosso piso salarial é uma falsa ideia de que não receberemos nenhum valor abaixo dele, mas os valores acima servem apenas para nos nivelar dentro de um controle econômico que não nos permite crescer em bens tanto intelectuais quanto materiais, ou seja, já nos está estabelecido o limite do quanto podemos comprar e o que comprar; não estamos livres nem para a aquisição de livros, isso por si só já prova como estamos num nível de absoluto controle.
Nossa carreira, para imprimir um calar rigoroso sobre algum possível despertar, é sufocante justamente para que os conservadores não percam as rédeas da situação, do contrário, se deixarem o nosso trabalho arejar a consciência, eles serão alertados sobre possíveis riscos. Entendeu agora por que temos salas lotadas e carga horária sobre-humana? Não é nada por acaso. É tudo parte de um planejamento. É você que não para para ver e sentir. Até você já assimilou isso como fruto do naturalismo. Você ainda acha que um dia isso será mudado, mas nunca parou para pensar que isso não foi feito para sofrer mudança alguma.
Agora já é possível entender por que os executivos NÃO QUEREM pagar o FUNDEB como o FUNDEB é e para o que ele é. Não é só um sadismo local, de fazer os professores sentirem o “cheirinho” – mas não ter o que lhes pertence – é um compromisso desse local com o plano global que não permite alimentar nenhum tipo de bonança, mesmo que momentânea, já que o uso desse recurso não produzirá riqueza a professor nenhum. Mas se assim não for, os conservadores se dirão passados para trás. Fere-lhes o ego amargamente, já que os professores não compõem a lista dos que podem ter ascensão social.
Então, dentro dessa linha: professores sem precatório.
A outra linha: “dialogar”. Entre aspas, se é que me entendem.

Vitória do Xingu, 28 de maio de 2019.
(reportar erros: Mirinaldo.silva@yahoo.com.br)

Nenhum comentário:

Postar um comentário