segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Oro por ti, menina de trinta.



Por Mirinaldo

Que teus dias sejam longos como são teus leitos de rio e que sejam anos suaves como teus braços de igarapés. Abraçada por águas, vives em eternos banhos dados pelo teu Xingu. Graciosa e bela sob o sol que se exibe para ti durante todos os dias e, tímido, esconde-se por trás da Ponta da Serra todas as tardes, és o encanto diário que dilata nossas pupilas e nos faz orgulhosos de sermos teus amantes fiéis e agraciados por tua baila. Serena e bela sob a luz da invejosa lua, estás sempre a cantar de tantas formas e de tantos tons que nossas almas encontram o deleite certo ao som de tua música. Acolhes-nos com tuas mangueiras, com sombras e frutas doces, ao mesmo tempo em que nos apaixonas com tuas pixonas de histórias mil que inspiraram as tantas gerações a se multiplicarem e até hoje guardas o segredo de todas elas. Vive triste quem não conheceu tal doçura da vida. Foste cúmplice dos encontros fortuitos e afortunados da caixa d’água, de onde, se quedasse tarde, soltavas a loira da mangueira expulsando os amantes ávidos por mais tempo sob a escuridão conclamada pelo silencioso motor de luz. E clamavas pela Matinta-Pereira, pelo Pinto-Pelado. E quantas novelas deste aos teus a oportunidade de assistir na praça dos Benjamins onde, às dezoito horas em ponto, tocavas a Ave-Maria. E quantos bilhetes ardentes de paixão foram lidos pela voz de ferro do alto-falante que ali tocava e embalava os namoros dos alunos que não se continham nas salas ao ouvirem as músicas românticas em inglês. Todos lugares suspeitos e proibidos de viverem a personificação da fala humana. Que se calem para sempre! Tu, Vitória, liberaste teus filhos para os banhos de água de chuva sob fortes trovões e relâmpagos numa água lamacenta que corria pela avenida Manoel Félix de Farias e terminava na praça dos Benjamins. Moleques e molecas davam seus gritos de euforia e voltavam para casa realizados e sem gripe alguma. Quando houvesse um corte, merthiolate! Aí se conhecia o grito da gurizada. Ou quando tiniam os galhos de goiabeira casas adentro, também se sabia que uma aula estava sendo dada. E tu, Vitória, rias-te sem parar. Eras uma menina que corria para o igarapé do Gelo, do Facão, do Tira-Calcinha, do Jandiá, que corrias pelos caminhos que levavam para as ramagens e árvores ao redor da vila de pescadores e estivadores. Eras tu que saltavas da rampa da Reicon, da Prainha e do Tuba. Moça levada que tocava tambor com Calazão, que dançava na Caçulão, no Vadoca e na Barraca. Eras tu que te benzias dos ciúmes das moças com ramos e atravessavas o campo Padre João, à noite, para cursar o magistério. Querias ser professora! Eras tu, ainda moleca, que choraste tantas vezes sob o sino tocado pelo seu Manoel do PT anunciando uma ida ou também que te assanhavas ao ouvir o mesmo sino aos domingos para as missas. Deixavas o dominó com o Chico Rita, com Tenório e tantos outros e te tocavas ao banho apressado e ias, com vestido de chita e perfume de lavanda para ouvir o padre dar seu sermão. E a quantas procissões foste descalça sob a chuva de maio e rogaste por um namorado. É por ti, que agora trintaste, que oro todos os dias para que sigas firme teu trajeto de cidade e que busques a maturidade que teus trinta anos te ensinaram. Que tua beleza seja o teu verde lindo aclamado em nosso hino e tua história seja a fonte das letras dos poetas filhos teus. E que tuas ruas cresçam em vida, em luz e em forte esperança de que cada dia é sempre um dia para recomeçar a pensar numa nova história chamada Vitória, uma vitória que começa no Xingu, teu pai, e termina no coração de cada filho teu. Daí por que te chamo: Vitória do Xingu. E te felicito, hoje e sempre!

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