Uma página coxinha no Facebook
está participando “ativamente” por um Brasil “sem” corrupção e “com”
desenvolvimento. Há na página dois argumentos para isso: o primeiro diz que as
coisas começaram a melhorar (e colocam a foto da mulher de Michel Temer). O
segundo é o que eu vou discutir aqui. Comecemos com a postagem publicada:
“Não é emocionante gente?
AQUELE MOMENTO EM QUE O PRESIDENTE FALA O PORTUGUÊS CORRETAMENTE
USANDO O PLURAL SEM GAGUEJAR PELA PRIMEIRA VEZ EM 13 ANOS” (ao lado, uma foto
de Michel Temer).
Em outras palavras, se um
presidente “domina” o “português corretamente”, estaremos felizes, certos de
que o Brasil está em boas mãos.
Aí eu pergunto: você conhece
alguém que fale o “português corretamente”? Mais uma pergunta: você sabe o que
é um “português corretamente”?
Não perca seu tempo. Você nunca
vai achar quem fale o “português corretamente”, uma vez que até hoje os
gramáticos e os linguistas não sabem definir o que é esse tal de falar “corretamente”
e nem se ele de fato existe. Temos então a primeira asneira sobre política
usando a nossa língua. Ou, usando uma palavra de um dos maiores linguistas do
Brasil, Marcos Bagno, isso é um mito.
Não há em toda a terra, nem na
história da humanidade alguém que tenha falado o “português corretamente” (com
aspas). Mas, pasme, todos os que falam português, falam o português
corretamente (sem aspas). Como assim? Falar, por si só, já é um ato correto,
funcional, ativo. Quantos falam português no Brasil? Não sei exatamente, pois
ainda temos as línguas indígenas, algumas línguas europeias e outras mais. Mas
afirmo: os que falam português aqui ou em qualquer lugar, falam corretamente.
Com diferenças, mas corretamente. Eu sei que a página do Facebook está tentando
nos enveredar para uma forma (entre centenas!) de falar o português: a padrão.
Aquela baseada na gramática normativa. Aquela ensinada nas escolas. E volto a
perguntar: quem fala daquele jeito que está nos manuais didáticos? Não responda
que é o professor! Ninguém o faz sem um contexto muito específico, mas muito
específico mesmo. E, quando se atrevem a fazê-lo, fazem baseados na escrita, ou
seja, o texto é escrito antes, decorado ou lido depois e qualquer improvisação
de fala fora dessa escrita é uma aventura. E o texto escrito não é certeza
nenhuma de estar “correto”.
Nem vale a pena questionar se
Temer sabe ou não gramática sem ter um texto escrito antes (o que garanto que
não sabe), mas vale muito a pena questionar por que tamanha asneira é usada
como se fosse um argumento dos mais validados possíveis para justificar que
Temer fará um bom governo pós-golpe pelo fato de alguém supor (eu disse: supor!
Ou mesmo perpetuar um preconceito!) que ele fala “corretamente” o português. E
mais ainda: que faz treze anos que não se ouvia isso. Na verdade faz treze anos
que os donos da página não estudam gramática alguma. E mais: se Temer não
gagueja quando fala, isso não altera o preço do dólar, nem do barril de
petróleo. Se ele fez o plural (o que tenho certeza que não acertou todas na
linha da gramática normativa) ou não, isso não traz de volta os empregos,
tampouco faz ele exonerar os ministros citados na Lava Jato. Nem conte com a
possibilidade de que Temer fale bem o “português corretamente”, pois estaremos
fritos. Avalie a política como ela é. O melhor presidente que o Brasil já teve
(falo com base em pesquisas) não tem nível superior algum. Já o que tentou
vender o Brasil para os Estados Unidos, via FMI, a preço de banana, fala cinco
idiomas e é sociólogo conceituadíssimo.
Ou seja, não saia do foco, não
tenha medo de discutir os problemas do Brasil. Use a nossa língua para isso.
Mas não a use como se ela fosse um fator isolado de você ou cristalizado numa torre
de marfim. Não adore a língua, seja a língua. Você é parte dela. E se você vai
comprar ou vender a ideia de que a gramática vai salvar a nossa pátria,
lembre-se: os próprios políticos não estão nem aí para isso. É você que está
perdendo tempo, enquanto eles decidem a sua vida. E então, vai ficar tentando
acertar questões de gramática ou vai usar a sua gramática para discutir o
Brasil?
PS: Só uma brincadeirinha de
gramática: os donos da publicação esqueceram uma vírgula. Meu Deus! O Brasil
está frito! Ainda bem que não foi o Temer!
Mirinaldo
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