sexta-feira, 24 de abril de 2015

COXINHAS: O MAU PRODUTO DA EDUCAÇÃO RETARDATÁRIA



Falhamos. Fracassamos. Envergonhamo-nos. Decepcionamo-nos. Nós. Nós que batemos no peito: professores! Ou mais ousados ainda: e-du-ca-do-res! Falhamos. Temos que assumir isso. Temos que nos envergonhar disso. É como se nada tivesse valido a pena. A nossa... a nossa alma foi pequena.
Era para termos ignorado a cartilha deles. Não deveríamos ter ficado nos verbos conjugados fora de todos os tempos, nos cálculos de probleminhas de matemática, nos desenhos ridículos de mapas do Brasil, nas experiências mesquinhas de combinações químicas, naquelas discussões fajutas sobre moral, república, Platão e não deveríamos ter decorado Camões, Manuel Bandeira ou termos perdido tanto tempo naquelas redações ridículas de “Como foram suas férias?”. Nossa! Quanta coisa não bastou. Nós nos bitolamos, fixamos o olhar para as coisinhas do ensino. E rezamos a cartilha direitinho. Nós ficamos de joelhos sempre. E ainda fizemos nossos alunos serem punidos, dando-lhes aquelas palmatórias (que, aliás, de nada serviram).
Quantos livros didáticos comemos? Quantas tabuadas foram compradas e decoradas a favor de imbecilidades? Quantos castigos foram dados em troca de um ensino de nada?
Nunca fomos professores de verdade. Só usamos essa palavra para firmar uma bandeira de luta. Uma luta que sempre perdemos. E ainda temos muito que perder. E por que pensar assim?
Simples.
Quantos imbecis de hoje não foram nossos alunos ontem? Quantos cretinos atuais não estiveram sob nossas ordens? Quantos ladrões republicanos não riram conosco em nossas salas? E eles se tornaram nossos chefes, nossos donos, nossos algozes. Assumiram o poder, estão no poder, e mudaram suas vidas roubando e criando leis idiotas, estúpidas, autoritárias, furadas, cheias de remendos para serem costurados conforme o interesse deles. Eles, os nossos ex-alunos. Não fomos capazes de educar os tais cidadãos de que falávamos e que fazíamos questão de escrever nas filosofias escolares. Não produzimos o animal político. Não produzimos os líderes de que falávamos. Foi um fracasso. E os bons? Os bons alunos... esses não chegaram lá. Resolveram ser como nós. E, sendo justos, foram e são injustiçados.
Nós não fizemos a devida interpretação dos fatos, não compreendemos corretamente o que diziam os verdadeiros filósofos (não falo de Platão, de grego nenhum, menos ainda romanos). Dizíamos que íamos alfabetizar (hoje dizemos “letrar”) nossas crianças para aprenderem a ler a vida, a serem cidadãos, a se reproduzirem criticamente e realizar a transformação social e política que poria o Brasil na realização de um sonho utópico: o da justiça social. Que nada. Banalizamos o ensino. Não chamamos a “missão” para nós, só o “trabalho”. Não fizemos as leituras que tínhamos que fazer, pelo menos do modo como deveríamos fazer. E nas universidades, só aprendemos a decorar Freud, Piaget, Valon, Emília Ferreiro e por aí vai. Fomos à luta com as mesmas armas com que entramos no nível superior. Ou seja, a universidade está corrompida igualmente os outros organismos, como as igrejas e as doutrinas. Foi só título. Antes os políticos (nossos ex-alunos!) temiam que um de nós fosse à faculdade. Hoje não faz diferença alguma. Eles, mesmo sem diploma, conseguem saber que por todos os meios estamos cerceados pelas vontades deles. O sistema é único. Nós, os professores (os e-du-ca-do-res!) é que somos células desconectadas e tão diferentes entre si.
Com a nossa alienação, fizemos um grande serviço ao sistema: ensinamos a ler, a escrever e isso automatizou as vítimas que hoje são chamadas de cidadãos. Sim, nós formamos os cidadãos. Eles estão por aí, leem, escrevem, e isso os torna aptos ao serviço da manutenção da ordem. Todos conhecem agora os seus direitos e deveres. Afinal, faz parte da decoreba, é tal como uma fórmula. E nosso papel fica nisto: mecanizar as mentes, tentar torná-las como as nossas. Em vão. Nossas mentes nunca saíram de nós. Nós só falamos para dentro.
Nós pensávamos que estávamos vendo o sistema de fora. Ilusão: estávamos no núcleo dele. Éramos nós que instrumentalizávamos as forças fracas de operários e vendávamos todos os civis para a continência à pátria violada e deitada eternamente nas casas de poder. Poder que nunca foi nosso. Mas que ajudamos a construir. Constituir? Nunca!
Qual político não foi um aluno? Qual deles nunca esteve ante nosso jugo? Todos. Mas o que eles fazem depois? Pagam a polícia (também nossos ex-alunos!) para nos prender e proteger a eles. Criam as leis que garantem seus privilégios milionários, tão longe da nossa realidade que nem chegam a pisar num hospital público para tomar sequer uma vacina. Que não deixam seus filhos estudarem em escola pública para não serem vítimas das migalhas que de lá caem. Que não viajam de ônibus. Nossa, quanta coisa nossa eles odeiam e lhes cheira mal. Somos o nojo dos políticos (nossos ex-alunos!). Quanta diferença em tudo! No salário nem se fala...
E eles criaram vida própria. Só descem do seu pedestal para usurpar nossos direitos e cobrar o nosso velho voto. Nossos ex-alunos.
Agora mudaram de religião. São globistas. Rede Globo falou, “tá falado”. E qual professor estará certo?
E hoje vemos ainda mais fatos que comprovam que falhamos na nossa educação. A educação estatal, não nossa. Nem sabemos mais qual é a nossa educação, se é que tivemos alguma. E não frearemos os resultados tão cedo da nossa falta de ação. Agora temos uns cidadãos chamados coxinhas. Eles, sim, representam uma educação padronizada, elitizada, formal, sabem tudo de direito constitucional. De história, então, nem se fala. São grandes exemplos de cidadania atualmente. São altamente midiáticos. Vão às ruas carregando seus filhos. Não praticam a incoerência, nem mesmo quando pedem democracia e ditadura ao mesmo tempo. Não podem ser vistos como loucos, arruaceiros, baderneiros, depredadores do patrimônio público. Aliás, quem seria o louco? Uma sociality com os seios de fora segurando uma imponente bandeira do Brasil e gritando “Fora Dilma!” (sem vírgula) ou um professor gritando “Paguem o piso!”? Depende. A Globo é que decide. Os coxinhas repetem e aí saberemos a resposta.
A atitude dos coxinhas não pode ser de todo negativa (retirando a ironia lá de cima). Afinal, era o principal exemplo que eu queria usar para comprovar que nós, enquanto professores (ou e-du-ca-do-res), falhamos. Coxinhas são um produto da educação que não soubemos dar. Enquanto só falávamos de Paulo Freire (aliás vi um cartaz “Fora Paulo Freire”) e de Carl Max só para exibir nossa decoreba da academia (nome chique para universidade), o capitalismo não perdia seu tempo. Como diz Padre Zezinho: “convencem mais cabeças do que o padre lá no altar”. Não deveria ter sido só uma teoria. Faltou levarmos à prática o que era socialismo, o que era Paulo Freire, o cristianismo de verdade, as culturas dos guetos e das favelas, dos sem-terra, dos ribeirinhos, dos índios, dos negros, tudo isso deveria ter entrado com força nas nossas práticas. Mas não. Só citamos, afinal não queríamos nos comprometer com doutrinas. Mas uma doutrina venceu: a do capitalismo. Hoje ela canta vitória. A Globo comemora 50 anos de pura vitória sobre tudo o que pensávamos que estávamos fazendo de diferente. Comparem o que ela incutiu nas cabeças dos brasileiros e o que nós pensamos que ensinamos aos alunos. Já antecipo: ela ganha. O que há de Globo e o que há de nós nas mentes deles? Perdemos de novo. Então ela comemora. Ela fez em 50 anos o que não fizemos em 500. Nunca se alienou tanto. Em curto espaço de tempo.
Os coxinhas? Bem, eles, há alguns anos estavam do lado de cá. Mas ascenderam economicamente. Eu disse “economicamente”. Hoje não se importam mais com o que ficou de fora do seu círculo de crescimento. Quando saltaram, recolheram a corda. Não olham para trás com equidade. Nem olham para trás. Eles passaram a idealizar uma bolha e colocaram dentro dela tudo o que ganharam e uma TV a cabo. E o que eles ganharam eles não concebem como fruto de um processo político e histórico. Para eles foi uma mágica, como os ricos ficam ricos nas novelas. E esses bens que eles têm agora começaram a ser conquistados por outros dos setores mais abaixo. Por conta disso, coxinha não suporta muitas coisas, e duas delas são: dividir o aeroporto e pagar direitos trabalhistas às domésticas. Há uma terceira que me ocorreu agora: odeiam bolsistas.
Os coxinhas são um produto do capitalismo, o sistema que nós não soubemos combater ou controlar. E dele apanhamos. E dele nos oportunizamos também para fazer nossas posses. Nós esperamos demais do Estado para ele providenciar os rumos da educação. E ele o fez. Aí está um dos produtos: os coxinhas. A nova mentalidade, ou mentalidade em satand by que agora vai às ruas exigir, cobrar, gritar e cantar o hino nacional. É uma alegoria, um exibicionismo, uma pobreza total de argumentos. Sim. Politicamente não se aprende nada com um coxinha, pois o que eles fazem é baseado nos impostos que pagam por conta de sua atual situação mui favorável. Eles foram às ruas mostrar que ascenderam e que querem um poder que olhe muito mais para eles e que reconheça isso.
Nós podemos até estranhar o que eles estão fazendo, mas se assustar nunca. Você, professor, compare o “que”, “como” e “por que” eles defendem o que defendem com o “que”, “como” e “por que” nós ensinávamos o que ensinávamos. Coerência? Nenhuma. Mas eles são nosso produto assim mesmo. Afinal, nós somos parte do sistema, somos engrenagem importante. Discordo quando dizem que o governo não investe no professor. Investe sim. O que o governo não faz é nos desamarrar do sistema, pois nós somos os que ensinamos a ler e a escrever. Só temos temor de ensinar a interpretar com compromisso. Seguimos perfeitamente a linha do “mostrar os dois lados”, a mesma coisa que a Globo faz, porém nós não assumimos lado nenhum, enquanto que ela o faz descaradamente.
Se a voz dos coxinhas não é a do país inteiro, mas de uma elite que se partidarizou e dramatiza ser livre de ideologia partidária, então o que esperar daqui para a frente? Não muita coisa que acrescente politicamente. Mas que se pode esperar mais atitudes que, com o apoio da Globo, podem se tornar inquietantes pelo número e não pela qualidade, isso sim pode e não será bom. Cada vez que forem às ruas e, mesmo com fundamentos afundados, mais a Globo pode vencer porque mobilizou mais “inconformados” e que, por conta disso, o governo deve ceder: ceder é sair, é fazer impeachment. E não precisa de base legal nem moral, basta que se aumente o número de pessoas nas ruas e que se expressem odiosamente. Ódio é o contrário de amor. Não ama, então deixa. Se os coxinhas não representam uma boa manifestação política para o país, o mais certo ainda é que na bola de cristal deles não aparece o que acontece com o Brasil depois que o PT sair. Mas eles querem o agora, e agora bradam que “Fora Dilma!” (sem vírgula) e “Fora PT!” (sem vírgula) já eliminam toda e qualquer corrupção. Aliás, para um coxinha, a corrupção começou com o Lula, o mesmo presidente que eles abraçaram e deram 85% de aprovação. Agora não presta mais. Mas eu me questiono: e se eles estiverem certos? Se dermos o impeachment de Dilma e eliminarmos o PT do mapa, findará a corrupção? Eu topo. Aí sobra PSDB, DEM, Agripino, Aécio, Marina Silva, Geraldo Alckmin, José Serra, Fernando Henrique...
Não! Os coxinhas não estão certos!
Espero que enquanto ficamos sabendo de tudo isso, possamos pensar no próximo produto que queremos oferecer de nós a uma sociedade justa, coerente, democrática (sem misturar com ditadura), inteligente, leitora dos fatos e não das paixões, amante de seus compatriotas e não odiosa e rancorosa sem causa.
Essa sociedade nasce de uma educação que não pode ser mais essa, uma educação derrotada pelo capitalismo e pelas demagogias da Rede Globo. Aliás, a Globo não precisa ser extinta, muito pelo contrário, ela deve estar firme para que possa ver, algum dia, que neste país nós fizemos uma educação para a real liberdade e não para a insanidade que insiste em se exibir sem rumo algum.




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